Derrubando mitos nas relações de trabalho

Derrubando mitos nas relações de trabalho

*José Emídio Teixeira

A atual temporada de greves provoca inquietações no mundo corporativo. Como sempre as movimentações promovidas pelos sindicatos deixam as lideranças empresariais tensas e preocupadas. É como se, repentinamente,  dessem conta de que não detém o controle sobre suas organizações. Há uma sensação de revolta e insegurança com este estado de coisas. Isto ganha mais força quando as greves ocorrem no próprio setor econômico ou na região onde as suas empresas se localizam.

A reação inicial é responsabilizar os sindicatos por esta desagradável sensação de mal estar. Afinal são eles que aparecem na mídia e nos boletins sindicais enumerando as mazelas das empresas e os resultados que pretendem obter com as paralizações em cadeia. São os sindicalistas que viram a cabeça dos trabalhadores, fazendo com que eles deixem de lado o comprometimento com as empresas para fazer reivindicações completamente fora da capacidade das empresas.

Este ano tem sido especial para atiçar a birra dos dirigentes empresariais com os sindicatos. Começou com a rebelião do Jirau que repercutiu com movimentos na Usina de Santo Antônio. Belo Monte também foi paralisada, mas, desta vez os sindicalistas não participaram. Tudo foi obra de índios, ambientalistas, pescadores e simpatizantes. A construção civil era a bola da vez e as greves pipocaram por todo o país, incluindo as obras dos estádios.

No meio do ano houve a temporada das montadoras no Paraná que começou com distribuição de PLR na estratosfera e culminou com o assombroso acordo da Renault com o inevitável impacto nas empresas automobilísticas do resto do país.

Isto foi pouco. Setembro trouxe as greves nos Correios e dos bancários que duraram semanas, invadindo o mês de outubro. O final deste mês nos reservou a paralização na Infraero e a surpreendente greve dos empregados do combativo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos.

É greve para ninguém botar defeito. Tem para todos os gostos e abordagens. O que faz tantos trabalhadores escolherem as greves para buscar respostas para suas demandas? Os sindicatos têm realmente o poder que lhes é atribuído para recomendar e liderar greves? Qual a influência das relações das empresas com os empregados nos movimentos sociais? As empresas podem fazer alguma coisa para evitar as greves?

Para começar os trabalhadores não gostam de fazer greves, mas, muitas vezes, são levados a fazê-las pela falta de atenção das empresas em entender suas expectativas e a falta de preparo das chefias para gerenciar suas equipes. Na falta de interlocutores internos, eles procuram os sindicatos que para atender seus clientes preferenciais usam seu repertório básico: panfletagem, pauta de reivindicações, negociações e, em muitos casos, a greve. Isto tudo, nem sempre, na ordem certa.

As empresas, por sua vez, negociam pouco e olham para o sindicato como um bicho de sete cabeças. Poucas estão aparelhadas para gerenciar as relações sindicais. Muitas das respostas obtidas pelos sindicatos pecam na forma e no conteúdo.

O resultado é que ambos se sentindo cobertos de razão após rápidas e infrutíferas tentativas de negociação desembocam no confronto. O fato é que o mundo mudou, os trabalhadores mudaram, as tecnologias mudaram, mas, a postura da maioria dos atores sociais continua atrelada à década de trinta do século passado. O governo, os empresários e os sindicalistas continuam a comemorar suas pequenas vitórias no varejo e conviver com derrotas no atacado. A principal dificuldade de todos parece ser passar a tratar os trabalhadores como os atores principais e não como coadjuvantes no cenário trabalhista. Patrões, sindicalistas e agentes do Estado insistem em resolver sozinhos os problemas dos trabalhadores, muitas vezes, sem antes consultá-los. As negociações e os debates muitas vezes ocorrem como se os trabalhadores fossem seres de ficção.

Os trabalhadores têm luz própria e deveriam ser chamados para participar. Ao contrário do passado, eles já não aceitam passivamente as orientações das lideranças, sejam das empresas ou sindicatos. Durante um trabalho recente que realizei em um workshop com trabalhadores ouvi uma afirmação de que eles não confiavam nem na empresa e nem no sindicato e queriam formar uma comissão de trabalhadores para acompanhar as negociações.

As empresas antes de responsabilizar os sindicatos deveriam avaliar a qualidade da relação que mantem com os empregados, considerando a qualidade do ambiente de trabalho, a comunicação interna, a forma como lidam com reclamações e reinvindicações, a ação das lideranças, os desafios e oportunidades que oferecem para seus colaboradores.

Os sindicatos patronais e laborais precisam repensar seus papéis e formas de atender seus clientes, empresas e trabalhadores respectivamente, não os vendo somente como fonte inesgotável de recursos financeiros, mas, como clientes. O modelo varguista, junto com o mercado interno garantido, criou uma falsa ilusão de que as entidades sindicais têm poderes para fazer o que quiserem. Isto corria no passado e era aceito pela maioria, porém, já não se

coaduna com as condições atuais da sociedade e da economia. O maior desafio das empresas e sindicatos é resolver os conflitos trabalhistas na perspectiva de que a maior ameaça são os produtos ofertados a preços mais baixos pela concorrência externa, venham da China, Índia ou alhures. Precisam olhar com outros olhos para a possibilidade de construir um pacto que favoreça o crescimento do mercado interno e fortaleça as empresas e trabalhadores.

As greves devem ser olhadas com indicadores da falta de qualidade das negociações e da gestão das relações com os empregados e não como um fenômeno incontrolável, uma espécie de ”tsunami social”. Por último, os dirigentes empresariais que insistem com razão na importância de trazer os trabalhadores para o lado da empresa, precisam se perguntar o que têm feito para garantir que as suas organizações se coloquem do lado dos seus colaboradores.

*José Emídio Teixeira é Diretor da Dialogar, consultoria especializada em Relações Trabalhistas  e autor do Livro “ Gerentes, Vampiros e Ideologia”.  Ele participa do 19º COMRH integrando o painel “Relações Trabalhistas e o Papel dos Líderes e Gestores” no dia 7 de maio, às 9 horas.

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