Pare um instante e reflita: o Brasil vive hoje um daqueles momentos decisivos. Enquanto países desenvolvidos recuam nos investimentos em diversidade, equidade e inclusão (DEI), nós estamos, enfim, lançando as bases de uma transformação inadiável. Os números falam por si e escancaram contradições gritantes: somos 56% de população negra (IBGE, 2023), mas apenas 4,7% chegam à liderança corporativa (Ethos/IBGE). Somos 52% de mulheres, mas só 15% ocupam cargos de CEO (Instituto Mulher 360). E mesmo com 24% das empresas descumprindo a Lei de Cotas (MTE), estudos mostram que times diversos geram 21% mais lucro (McKinsey).
Isso não é apenas uma dissonância estatística — é um chamado à ação. Como justificar que, em um país que transborda diversidade, os espaços de poder ainda resistam tanto a refletir essa realidade? É preocupante ver multinacionais importando para o Brasil a onda de cortes em iniciativas de DEI. Mal começamos a colher os frutos dos primeiros programas, e já falam em desmonte? É como abandonar a construção de uma casa logo após erguer as fundações. Um erro estratégico — e um retrocesso perigoso — para o nosso desenvolvimento corporativo e social.
A verdadeira virada pode estar justamente nos conselhos administrativos. Esses espaços, historicamente exclusivos e pouco diversos, começam a se abrir — não por gentileza, mas por pura estratégia. Os dados do Fórum Econômico Mundial são contundentes: conselhos diversos tomam decisões 60% mais eficazes. Os números falam por si. Chega de discursos genéricos e promessas vazias. O que precisamos agora são métricas concretas: Quantas mulheres foram promovidas este ano? Qual é o gap salarial entre gêneros em cargos equivalentes? Quantas pessoas negras ocupam posições de liderança? Esses dados podem incomodar, sim — mas são o diagnóstico essencial para a transformação que precisamos promover. Não há avanço sem transparência. E não há inclusão verdadeira sem responsabilidade nos números.
Estamos definindo que tipo de país queremos construir. Um que perpetua desigualdades ou um que transforma diversidade em vantagem competitiva? A resposta está nas mãos de cada profissional que ousa ocupar esses espaços. A transformação real vem da base. Quantas vezes você deixou de falar sobre diversidade por achar que não era o momento? A verdade é que ninguém nasce especialista. O que nos transforma é a coragem de levantar a voz, mesmo quando ela treme. Daqui a 20 anos, como querem ser lembrados? Como mantenedores do status quo ou como agentes de mudança?
O momento exige que as empresas brasileiras não apenas mantenham, mas dobrem a aposta em DEI — adaptando estratégias à nossa realidade única, com iniciativas como cotas raciais, programas de formação de talentos periféricos, entre outras ações estruturantes. Ignorar esse movimento significa perder muito mais do que justiça social: é abrir mão de uma vantagem competitiva em um mundo que, apesar de retrocessos pontuais, segue avançando em direção à diversidade.
Às lideranças brasileiras cabe hoje um papel duplo e decisivo: resistir à maré negacionista global e ampliar ações concretas. Diversidade não é uma tendência passageira — é alavanca para inovação, motor de resultados sustentáveis e pré-requisito para qualquer organização que queira refletir e prosperar em um país plural como o nosso. Quem lidera hoje carrega uma responsabilidade histórica: ser cúmplice do atraso ou arquiteto de um futuro mais competitivo, inclusivo e justo.
DEI não é só sobre números ou compliance. É sobre pessoas reais, com histórias reais, que merecem oportunidades reais. E se tem uma coisa que aprendi nessa vida é que mudança mesmo só acontece quando a gente para de esperar e começa a agir.
O momento pede coragem: enquanto o mundo oscila, o Brasil tem a chance de se tornar referência em DEI, não por caridade, mas por estratégia. Afinal, como mostrar relevância em mercados globais sem espelhar a diversidade do próprio país? A resposta está nas mãos de quem ocupa, ou almeja ocupar posições de lideranças ou de conselhos de administração. O futuro não será moldado por quem espera convites, mas por quem constrói as novas mesas.